Durante muito tempo, o Brasil olhou para o Norte como uma região exótica, distante. Agora, a gente tem a atenção de boa parte do mundo. Além de olhada, a Amazônia precisa ser escutada. E temos uma geração de mulheres que transformam a música em ferramenta de identidade, cura e resistência. São artistas que rimam sobre corpo, território e espiritualidade. Já anota aí alguns nomes que fazem da Amazônia um horizonte para a criação musical brasileira.
Anna Suav: a força da mulher nortista
Nascida em Manaus (AM) e radicada em Belém, Anna Suav é MC, poeta, cantora, compositora e produtora cultural. Seu começo foi com o “Slam Dandaras do Norte”, coletivo de poesia formado por mulheres negras. Essa vivência moldou o olhar da artista sobre palavra e performance, abrindo caminho para uma carreira em que arte e militância andam juntas.
Suav representa uma nova escola do rap, que mistura discurso e afeto sem perder a contundência. Seus trabalhos mais marcantes são o EP “Eva Grão” (2021), e o álbum visual “Ritual das Candeias” (2022), feito em parceria com Bruna BG, em que música e imagem se fundem num manifesto artístico.
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Nic Dias: poesia e resistência da periferia
De Icoaraci, distrito de Belém, Nic Dias carrega no sotaque e nas letras o retrato de uma juventude negra que aprendeu a sobreviver com arte. Começou na poesia em 2013 e entrou no rap alguns anos depois, levando para o microfone a mesma urgência e delicadeza de quem escreve para existir.
Além de MC e compositora, ela lidera o projeto “Olhar Invisível”, que usa a arte como ferramenta de transformação social. Nic rima sobre autoestima, dor e pertencimento. Temas que atravessam o rap com sinceridade.
Bruna BG: entre o rock, o rap e as águas do Marajó
Natural de Breves, na Ilha do Marajó (PA), Bruna BG começou no rock adolescente e, anos depois, encontrou no rap uma linguagem mais próxima de sua espiritualidade e vivência periférica. Cofundadora do Clã do Norte, é uma das vozes mais potentes do rap amazônico.
Filha de uma mulher preta curandeira, Bruna leva essa herança para a arte. Suas músicas misturam feminilidade, ancestralidade e crítica social, com força e doçura na mesma medida. Seu trabalho mais emblemático é o álbum visual “Ritual das Candeias” (2022), ao lado de Anna Suav.
MC Deeh: trap funk e voz do Amapá
Ana Débora é de Macapá (AP), mas é sob o nome de MC Deeh que ela começou como B-girl no grupo F.A Flavor Bgirls. Ela é considerada precursora da cena feminina do trap/funk e rap amapaense.
Em 2022, lançou o álbum “Deus(A)”, seu primeiro álbum solo, que aborda protagonismo negro, juventude e resistência. Deeh fala sobre racismo e machismo, sem abrir mão da batida envolvente. Uma artista que transforma a luta em festa, e vice-versa.
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Djuena Tikuna: o canto de uma aldeia
Do povo Tikuna (Magüta), nascida na Aldeia Umariaçu II, em Tabatinga (AM), Djuena Tikuna é cantora, atriz, compositora, produtora cultural e formada em jornalismo. Aliás, a primeira jornalista indígena do Amazonas. Ela se define como “cantora do movimento indígena” e usa a música como denúncia da violência, do racismo e da destruição ambiental.
Quando subiu ao palco do Teatro Amazonas com o show de lançamento do álbum “Tchautchiüãne” (2017), Djuena se tornou a primeira artista indígena a apresentar um espetáculo completo naquele espaço. Seu trabalho mais recente, “Torü Wiyaegü” (2022), mistura música, livro e documentário, reafirmando a urgência da arte como ferramenta de memória.
O Norte canta, rima e reivindica espaço
Entre beats e vozes femininas, não faltam exemplos para mostrar que o mapa da música brasileira se redesenha a partir da Amazônia. Dessa vez, ninguém vai silenciar o som da floresta.
Veja a publicação anterior da coluna:


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